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Na várzea amazônica, agroindústria opera com sistema inédito de energia

Com energia solar e armazenamento automatizado, unidade operada por extrativistas na Ilha das Cinzas (PA) eleva renda local e vira modelo nacional de autonomia energética

Gabriel da Mota

Na comunidade ribeirinha da Ilha das Cinzas, em Gurupá (PA), no arquipélago do Marajó, uma agroindústria operada com sistema off-grid marca um avanço tecnológico inédito para a sociobioeconomia amazônica. Pela primeira vez, a bateria é o cérebro da operação energética, controlando o fluxo da energia solar armazenada. A inovação permite à comunidade extrativista vender não apenas sementes, mas óleos e manteigas vegetais com maior valor agregado, elevando em até 60% a renda das famílias, segundo a Natura.

Instalada em área de várzea, onde o transporte é fluvial e a rede elétrica não chega, a unidade é fruto de uma parceria entre a Natura, a WEG e a Associação dos Trabalhadores Agroextrativistas da Ilha das Cinzas (ATAIC). Foram mais de três toneladas de equipamentos transportados de Santa Catarina até a ilha, em uma operação complexa que envolveu barcos, caminhões e plataformas improvisadas. Como o cabeamento convencional é inviável em áreas que alagam, toda a instalação foi adaptada sobre o telhado do galpão.

A agroindústria é a primeira do tipo construída em área de várzea e operada totalmente com energia limpa, o que a torna um marco replicável para outras regiões amazônicas.

image Primeira agroindústria comunitária em área de várzea na Amazônia, na Ilha das Cinzas, Gurupá (PA) (Anderson Águia Drone / Natura / WEG)

Segundo Daniel Godinho, diretor de Sustentabilidade e Relações Institucionais da WEG, “o papel das baterias é captar a energia natural do sol e, nos momentos de necessidade, disponibilizar para a operação crescer, gerar mais renda e desenvolvimento para a ATAIC”.

Para Alexandre Eiji Amano, gerente de Sustentabilidade da WEG, o diferencial do sistema está justamente no controle inteligente: “Apesar de já termos outros casos de produção solar isolada, esta é a primeira vez em que a bateria comanda a geração. O gerador a diesel é só backup”, pontua.

image Início das operações da agroindústria, no último 23 de maio (Anderson Águia Drone / Natura / WEG)

Com apoio da W-Energy na execução técnica, o sistema foi dimensionado para operar com o dobro da capacidade atual, já prevendo a expansão da agroindústria. O objetivo das empresas é garantir resiliência energética e inspirar o desenho de programas em áreas remotas semelhantes.

Modelo de autonomia

A tecnologia implementada marca a 20ª agroindústria da Natura na Amazônia e a primeira 100% solar com sistema automatizado de baterias, a um custo estimado de R$ 2 milhões. Para Angela Pinhati, diretora de Sustentabilidade da empresa, o projeto representa um marco. “Mostra que é possível transformar desafio socioambiental em oportunidade de negócio, trazendo a transição energética justa para todos e incrementando a renda das pessoas dessa comunidade”, afirmou.

A operação da unidade é feita em parceria com a ATAIC, que há mais de 10 anos fornece insumos como murumuru, ucuuba e patauá para a Natura. A associação trabalha com cerca de 450 famílias em municípios como Gurupá, Afuá, Chaves, Breves, Anajás (PA) e Mazagão (AP), e estima dobrar esse número com o novo modelo. Agora, com o beneficiamento local, a ATAIC a a vender manteigas vegetais em vez de sementes — o que significa mais valor, mais autonomia e novos desafios logísticos e técnicos para os moradores.

“A COP 30 é um momento muito relevante. Faz 25 anos que atuamos na região, com mais de 45 comunidades e 11 mil famílias. Esse projeto será, com certeza, um exemplo possível a ser apresentado em Belém”, completou Pinhati.

image Angela Pinhati, diretora de Sustentabilidade da Natura (Gabriel da Mota / Especial para O Liberal)

O novo modelo energético e produtivo exige novas competências. Moradores da ilha já foram capacitados para operar o sistema e dar e técnico local. “Nós começamos esse trabalho com um treinamento básico e agora vamos envolver universidades do Pará e do Amapá para garantir a continuidade da manutenção e a disseminação da tecnologia”, explicou Godinho. Segundo ele, a ideia é formar técnicos locais e até novos empreendedores em energia renovável.

A infraestrutura também recebeu e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Amapá, que colaborou na implementação do sistema de saneamento e tratamento de água da agroindústria.

Associação vislumbra novos frutos

Para Francisco Malheiros, presidente da ATAIC, a agroindústria representa um salto estratégico. “Agora, em vez de comprar e vender sementes, a gente vai comprar sementes e vender óleos e manteigas. Isso muda tudo”, explica. Segundo ele, a ATAIC já apoia pesquisas acadêmicas em parceria com universidades para compreender melhor o manejo sustentável das espécies — desde o ciclo da germinação até a produtividade por cacho — e garantir o equilíbrio entre produção e preservação.

image Josi Malheiros, sócia-fundadora da ATAIC (Anderson Águia Drone / Natura / WEG)

Para Josi Malheiros, sócia-fundadora da ATAIC, a parceria com o setor privado inaugura uma nova etapa de esperança.

“Nosso papel está só começando, agora é falar sobre esse modelo replicável para outras regiões. Acredito que, assim como a WEG, outras empresas também podem vir. Às vezes achamos que estamos fazendo pouco, mas é a nossa vida inteira que está ali”, afirma.

Segundo os irmãos Malheiros, a comunidade já sonha com a criação de uma nova agroindústria, voltada à produção de alimentos como açaí, banana e buriti, ampliando o alcance da agricultura familiar.

*O jornalista viajou a convite da Natura e da WEG.

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